O privilégio de ser PM
Nesta semana, tivemos um triste episódio envolvendo um irmão nosso de farda. Um soldado de 33 anos de idade, Fábio Júnior Lisboa, lotado no 1º Batalhão Metropolitano, encontrava-se de folga fazendo uma refeição em um estabelecimento comercial no Capão Redondo, zona sul de SP.
Por volta de 22h30, quatro criminosos entraram no local, anunciaram assalto e começaram a roubar os clientes. Revistavam um por um, procurando carteiras, celulares, armas.
Sentindo a aproximação do marginal, sabendo que seria revistado e identificado, não houve alternativas ao soldado. Ele sacou sua pistola e disparou. Dois criminosos correram para fora, dois correram para o fundo do local, e Fabio correu atrás destes últimos. Foi atingido nas costas por dois disparos. Socorrido, não resistiu aos ferimentos. Morreu.
Que reflexões devemos fazer a respeito desse acontecimento?
Que lições tirar desse trágico episódio da vida real na metrópole paulista?
Talvez alguns digam que o policial não deveria estar lá, porque é um lugar perigoso, incompatível. Outros dirão que, se estivesse desarmado, teria apenas sido roubado e estaria vivo agora. Outros ainda têm a certeza de que ele não deveria ter ido atrás daqueles dois bandidos.
São muitas circunstâncias, conjecturas, e muitos são os comentaristas de ocorrências alheias, e terminadas.
Aquele local, assustador para muitos, era comum para o militar, era local de trabalho, e de frequência. Sim, muitos soldados frequentam lugares periféricos, pobres, porque eles próprios, soldados, são periféricos, pobres.
Lembremos que bares e restaurantes na região central e em áreas nobres também já sofreram roubos similares, e o risco de estar presente numa hora dessas torna tudo igual, bairros ricos, bairros pobres, clientes ricos, pobres. No fim das contas, o crime acontece e não escolhe local, tampouco vítima.
O ponto crucial é: nós, policiais militares, não somos cidadãos plenos, não temos vida social, não temos o modo “off”.
Os patrulheiros não têm direito de escolher entre andar armados ou desarmados.
Em situações como essa, não há como se fingir de paisano.
Assim como bons policiais identificam criminosos — mesmo que não estejam cometendo crimes —, criminosos perspicazes também identificam policiais, mesmo sem farda. Além disso, há sempre o risco de se deparar com bandidos que foram presos e voltaram às ruas.
É duro admitir, mas não temos folga plena, não temos férias plenas ou aposentadoria plena. Na hora em que a situação fede, somos lembrados por nossos familiares, amigos, vizinhos. Somos sempre guardiões prestes a ser acionados, e assim juramos, inclusive hipotecando a própria vida.
Diante de tudo isso, o pior é termos de ouvir jornalistas, economistas, especialistas de toda sorte dizerem — e a sociedade repetir — que somos privilegiados por trabalharmos “apenas” 30 anos.
Pois experimentem ser PMs no Brasil, por esse tempo, nessas condições, e depois respondam se isso é privilégio. Analisem os homicídios de PMs, os suicídios, os policiais paraplégicos, tetraplégicos, as baixas médicas de toda ordem: ortopédicas, cardiológicas, psiquiátricas…
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